Grupo de WhatsApp com Cid e militares da ativa discutiu golpe: ‘Se Bolsonaro acionar o 142, não haverá general que segure as tropas’

Bolsonaro e Mauro Cid

Bolsonaro e Mauro Cid Presidência/Alan dos Santos

A Polícia Federal identificou que o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, fazia parte de um grupo de WhatsApp com militares da ativa em que foi defendido um golpe de Estado após a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva na eleição do ano passado. As conversas extraídas pela PF não mostram mensagens de Cid defendendo a ruptura neste grupo.

Um contato identificado como Gian defendeu, por exemplo, uma “ação por parte do PR e FA, que espero que ocorra nos próximos dias”, em referência a Bolsonaro e às Forças Armadas.

Ao longo das trocas de mensagens extraídas pela PF, os integrantes do grupo defendiam que o país caminhava para uma crise “muito forte”, após a vitória de Lula, e que por isso seria necessário um golpe de estado com a participação das Forças Armadas.

“A ruptura institucional já ocorreu há muito tempo. Tudo o que for feito agora, da parte do PR, FA e tudo mais, não vai parar a revolução do povo que cansou de tudo isso”, diz outro integrante do grupo, em 27 de novembro do ano passado.

“Assim espero”, respondeu outro integrante.

O grupo acreditava que as tropas iriam agir independente da adesão ou não de seus comandantes. “Confio muito em nós, mas somente em nós”, disse Gian. “Já pensem na proteção das nossas famílias”, acrescentou.

Em outro trecho da conversa, ocorrida no em 21 de dezembro de 2022, um integrante do grupo identificado como Márcio Resende disse: “Se Bolsonaro acionar o 142 (em referência ao artigo da constituição), não haverá quem segure as tropas. Ou participa ou pede para sair”.

Mensagens extraídas do celular de Cid — Foto: Reprodução

Mensagens extraídas do celular de Cid — Foto: Reprodução

Em diversos momentos, os integrantes do grupo se referem ao ministro Alexandre de Moraes de uma forma jocosa, com apelidos que circulam no meio bolsonarista. Também sugerem vingança, em caso de consolidação do golpe militar. “Vai ter careca sendo arrastado por blindado em Brasília?”, pergunta um membro do grupo.

Em nota, os advogados Bernardo Fenelon e Bruno Buonicore, que defendem Cid, afirmaram que “por respeito ao Supremo Tribunal Federal, todas as manifestações defensivas serão feitas apenas nos autos do processo”.

Entenda o caso

O celular do ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), tenente-coronel Mauro Cid, tinha mensagens e documentos que revelam uma trama para dar um golpe de estado, afastar ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e colocar o país sob intervenção militar.

Conforme revelou O GLOBO em maio, a PF já havia identificado áudios e mensagens nos arquivos do celular do major reformado do Exército Ailton Gonçalves Barros que “evidenciavam” a discussão do plano golpista. Entre as mensagens que chamaram a atenção da PF, estão dois prints (capturas de tela) de uma conversa entre Barros e um contato denominado “PR 01”, “possivelmente relacionado ao ex-presidente Jair Bolsonaro”.

Já no celular de Cid, um dos auxiliares mais próximos de Bolsonaro, a PF encontrou um documento intitulado “Forças Armadas como poder moderador”. Nele é apresentado um plano baseado numa tese controversa em que militares poderiam ser convocados para arbitrar conflitos entre os poderes.

O documento ensina uma espécie de “passo a passo” do golpe e não é o mesmo da minuta golpista encontrada com o ex-ministro Anderson Torres. Segundo o plano, Bolsonaro deveria encaminhar as supostas inconstitucionalidades praticadas pelo Judiciário aos comandantes das Forças Armadas. Os militares então poderiam nomear um interventor investido de poderes absolutos.

Esse interventor, na sequência, poderia fixar um prazo para o “restabelecimento da ordem constitucional”. Assim, poderia suspender decições que considerasse inconstitucionais, como a diplomação de Lula. Além disso, poderia afastar preventivamente ministros do STF como Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski, que na época integravam o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). No lugar, convocaria os substitutos, Kassio Nunes Marques, André Mendonça e Dias Toffoli.

Os documentos publicados pela Veja fazem parte de um relatório de 66 páginas produzido pela Diretoria de Inteligência da Polícia Federal. No telefone de Mauro Cid foi encontrado ainda outro documento, onde é aventada a hipótese de decretação de estado de sítio, uma das medidas mais extremadas previstas na Constituição para situações excepcionais, como em caso de guerra.

A trama incluiu até mesmo integrantes do alto escalão das Forças Armadas, como atestam diálogos do coronel Jean Lawand Junior, então subchefe do Estado Maior do Exército, com Mauro Cid. Após a derrota de Bolsonaro nas urnas, Lawand manteve contato frequente com Cid e cobrou, repetidamente, que fosse colocado em prática um plano golpista.

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