Decisão do Copom conclui que a reunião é técnica, diz Campos Neto

O presidente do BC (Banco Central), Roberto Campos Neto, disse nesta 5ª feira (27.jun.2024) que a manutenção da taxa básica, a Selic, de forma unânime, em 10,5% é uma forma de “dirimir” os ruídos de críticas de que as decisões não são técnicas. Afirmou que foi a reunião do Copom (Comitê de Política Monetária) com maior “espírito de equipe” para corrigir o ruído do encontro anterior.

Ele concedeu entrevista a jornalistas em São Paulo durante a apresentação do RTI (Relatório Trimestral de Inflação), divulgado nesta 5ª feira (27.jun.2024). O documento mostra que o BC aumentou para 2,3% a projeção para o crescimento do PIB de 2024. Também mostra que as probabilidades de a inflação do Brasil ficar acima da meta de 3% são de 28% em 2024, de 21% em 2025 e de 17% em 2026.

Assista:

Campos Neto disse que, apesar de o mercado negociar juros mais altos nos negócios, o aumento da taxa básica, a Selic, não é o cenário base do Banco Central. O presidente do BC afirmou que a autoridade monetária monitora o cenário e houve uma preferência de não dar uma sinalização sobre o que fazer com o juro base.

A ata do Copom (Comitê de Política Monetária) divulgada na 3ª feira (25.jun.2024) deixou a porta aberta para “ajustes futuros”. Ele afirmou que a mensagem é que o BC não quer “dar o guidance”, ou indicativo de mudança na Selic, mas seguirá vigilante.

Campos Neto afirmou que há uma característica parecida da política monetária com a fiscal.

Tem uma inflação corrente está mais ou menos em linha com a desaceleração esperada, mas tem uma desancoragem de expectativa de inflação, enquanto o fiscal tem números que não estão muito diferentes do esperado no curto prazo, mas existe uma percepção grande de piora do fiscal […] quando a gente olha a parte qualitativa”, disse.

Segundo Campos Neto, essa dupla percepção de piora para o futuro fez com que houvesse o aumento do prêmio de risco, demonstrado na curva de juros de longo prazo negociados no mercado financeiro.

O presidente do BC disse que há um ruído político e questionamentos da capacidade de tecnicidade sobre as decisões do Banco Central. Ele afirmou que a decisão de

“A gente entende que a decisão tomada foi uma decisão no sentido de dirimir essa possível interpretação de ruído e de deixar bem claro que nossa decisão é técnica e não tem componente político”, disse.

Campos Neto disse que foi uma das reuniões do Copom que teve mais “espírito de equipe” entre os integrantes. Afirmou que ele e os diretoresent enderam que havia um “problema” e que era trabalho do Banco Central era passar uma mensagem de que a decisão era técnica.

DÓLAR ALTO

O presidente do BC disse que a intervenção pontual no  mercado de câmbio teria pouca efetividade no contexto atual de desvalorização do real. Afirmou que a autoridade monetária só fará intervenção quando houver disfuncionalidade do mercado cambial.

Campos Neto disse que o BC acredita que o câmbio é flutuante e que as atuações no mercado têm que ser feitas quando houver disfuncionalidade pontual. “Nós fazemos intervenção de câmbio visando ou mirando nenhum tipo de nível ou com nenhum preço pré-determinado”, declarou.

Ele defendeu que a desvalorização do real em relação ao dólar está “em linha” com algumas outras variáveis que também “simbolizam preços de risco Brasil”, como os juros longos e o prêmio de risco na NTN-B (Nota do Tesouro Nacional Série B).

“Como a gente teve um movimento onde o prêmio de risco sofreu uma piora nas últimas semanas, fazer intervenção pontual no mercado tem pouca efetividade, porque o que acontece é que transborda a demanda de head de um mercado para o outro”, disse.

Campos Neto disse que o câmbio flutuante permite absorção de choques e que o BC só fará intervenção quando houver disfuncionalidade. O dólar atingiu R$ 5,52 na 4ª feira (26.jun.2024).

Segundo ele, há um ruído de curto prazo e que é preciso falar de variáveis “mais estruturais”.

META DE INFLAÇÃO

Campos Neto elogiou a meta contínua de inflação de 3%. Disse que o decreto implementa um prazo de 36 meses para a mudança de patamar entrar em vigor, o que dá previsibilidade e possibilita investimento de longo prazo.

Campos Neto disse que a mudança sobre a meta de inflação, para o formato contínuo, não significará uma mudança “na forma como enxergamos a política monetária” e nem “maior ou menor suavização”. O presidente do BC afirmou que o ano fiscal não era a maneira mais eficiente de auferir os resultados da política monetária.

Ele elogiou o prazo de 36 meses para uma eventual mudança da meta de inflação entrar em vigor.
“A gente teve, então, incluído no decreto o período de 36 meses. Mostra bastante o compromisso do governo, a transparência que foi atingida”, disse. “Ajuda muito porque dá estabilidade na projeção da meta. Faz com que os agentes financeiros consigam entender melhor o sistema e ter mais previsibilidade. Maior previsibilidade significa maior capacidade dos agentes se programarem e maior fomento ao investimento de longo prazo, taxas de juros longas mais estáveis e, de uma forma geral, aumenta a eficiência do canal de transmissão de política monetária”, completou.

CAMPOS NETO

Roberto Campos Neto, 54 anos, assumiu o comando do Banco Central em 28 de fevereiro de 2019, indicado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e com apoio do ex-ministro da Economia Paulo Guedes. Em 2021, o Congresso aprovou e o governo sancionou o projeto de autonomia operacional da autoridade monetária.

A lei estabeleceu mandatos para o presidente e os diretores do BC com o objetivo de dar independência à política monetária. Cada indicado fica no cargo por 4 anos. O mandato de Campos Neto vence em dezembro de 2024.

Ele foi amplamente criticado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e aliados petistas, que o viam como adversário político e defensor do governo Bolsonaro. As principais reclamações foram em relação ao patamar da taxa básica, a Selic.

O Copom (Comitê de Política Monetária) é integrado pelos 8 diretores e o presidente do Banco Central. Definem o patamar do juro base. De 2021 a 2022, antes de Lula, o colegiado fez a o maior ciclo de aumento da taxa Selic no século 21. A taxa Selic aumentou 11,75 pontos percentuais, de 2% a 13,75% ao ano.

A medida coincidiu com o período eleitoral no qual o ex-presidente Jair Bolsonaro buscava se reeleger. Os reajustes foram tomadas para diminuir as pressões inflacionárias potencializadas pelas medidas de incentivos fiscal e monetário na pandemia de covid-19. O IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) atingiu uma alta de 12,13% no acumulado de 12 meses até abril de 2022, quando, posteriormente, começou a cair. Terminou aquele ano a 5,79%.

Lula assumiu o governo, portanto, com a taxa Selic já a 13,75% e uma inflação de 5,79%. A meta de inflação em 2023 era de 3,25% e o intervalo permitido era de até 4,75%. O Banco Central manteve o juro no mesmo patamar até agosto de 2023, quando iniciou o ciclo de cortes da Selic. O juro base recuou de 13,75% a 10,5% até junho de 2024.

RELAÇÃO COM LULA

Lula começou a criticar o Banco Central e o presidente Campos Neto publicamente em 18 de janeiro de 2023. Na época, disse que o BC independente é “bobagem” e que queria mudar a meta de inflação. As críticas se intensificaram ao longo do 1º semestre e início do 3º trimestre. Diminuíram quando o BC começou a cortar os juros, já com a inflação a 3,16% no acumulado de 12 meses até junho de 2023 e projeção de 4,84% para aquele ano.

Mesmo com as estimativas acima da meta de 3,25%, o BC avaliou que havia uma tendência de queda resultante da política monetária restritiva. A tensão arrefeceu e, no fim de 2023, Campos Neto foi convidadopara um churrasco com o presidente.

Lula voltou a criticar o comandante do BC quando a autoridade monetária começou a dar sinais de preocupação e sinalizar uma redução da corte da Selic. Em maio deste ano, o Copom reduziu os juros em 0,25 ponto percentual, uma redução menor do que foi sinalizada anteriormente.

A reunião de maio teve um racha na diretoria. Todos os integrantes indicados por Lula votaram por um corte de 0,5 ponto percentual, enquanto que aqueles nomeados por Bolsonaro, inclusive Campos Neto, optaram pela diminuição de 0,25 ponto percentual. O placar final foi de 5 a 4 para a redução de 10,75% para 10,5%.

Lula e aliados elevaram o tom das críticas e o racha na diretoria provocou uma insegurança entre os agentes financeiros em relação ao futuro da autoridade monetária. Intensificaram-se as preocupações de politização do BC.

No último encontro, de 19 de junho, o Copom optou por manter a Selic em 10,5% ao ano. A votação foi unânime. O presidente Lula e aliados criticaram a decisão. O presidente declarou que Campos Neto é um “adversário político e ideológico”.

Na 4ª feira (26.jun.2024), o CMN (Conselho Monetário Nacional) –formado pelos ministros Fernando Haddad(Fazenda), Simone Tebet (Planejamento e Orçamento) e o presidente do BC, Roberto Campos Neto– votou para manter a meta de inflação em 3%. Será uma meta contínua e qualquer mudança no patamar deverá ser feita com antecedência de 36 meses. Portanto, a meta de inflação de 3% vale ate, pelo menos, 2027.

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