O líder da oposição no Senado, Rogério Marinho (PL-RN), entrou com uma representação na AGU (Advocacia Geral da União) contra o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, por supostamente ter espalhado fake news a respeito de dados econômicos. Leia a íntegra (PDF – 1 MB).
Em audiência pública realizada na Comissão de Finanças e Tributação na Câmara dos Deputados em 22 de maio de 2024, Haddad afirmou que o Orçamento de 2023 foi enviado pelo governo de Jair Bolsonaro (PL) com a estimativa de um deficit primário de R$ 63 bilhões, mas não contava com algumas despesas que estavam previstas.
Segundo Haddad, esses são os gastos que ficaram de fora:
- Bolsa Família – R$ 60 bilhões;
- Precatórios – R$ 90 bilhões;
- Previdência Social – R$ 15 bilhões;
- Compensação do ICMS a governadores – R$ 26,9 bilhões.
“Herdamos um problema fiscal de R$ 250 bilhões a R$ 300 bilhões. Eu estou apresentando um número. Eu estou apresentando as contas públicas tais como elas são. Nós recebemos um problema fiscal, em 2023, dessa ordem”, declarou.
Segundo Haddad, Bolsonaro teria dado um “calote” de R$ 90 bilhões nos precatórios. “Nós pagamos um calote do governo anterior, e o senhor [deputado Felipe Barros (PL-PR)] coloca isso na conta do Presidente Lula, que nunca deu calote. Só houve, desde a redemocratização, 2 presidentes que deram calote: o Collor e o Bolsonaro“, disse Haddad. Segundo ele, essa conta seria de R$ 90 bilhões.
Em sua representação, Marinho citou a MP 1.200/2023, de dezembro de 2023, na qual o atual governo aponta estoque de precatórios de R$ 93 bilhões que não tinham sido previstos nas Leis Orçamentárias de 2022, 2023 e 2024, em função da PEC dos Precatórios. Desse total, R$ 62 bilhões são referentes aos exercícios de 2023 e 2024, no atual governo. Só R$ 30 bilhões do governo anterior.
“É falsa a afirmação de que o deficit de R$ 90 bilhões é a ‘maior’ causa para um suposto ‘calote’, como o ministro insiste em repetir. Portanto, não há que se falar em ‘calote’ do governo Bolsonaro“, disse Marinho na representação.
“O mais importante: o resultado estrutural (conta que retira precatórios e venda de ativos, por exemplo) do governo passado foi positivo em 2021 e 2022. O atual governo fechou 2023 com déficit estrutural de -1,6% do PIB“, disse.
Marinho acionou a AGU por meio da Procuradoria Nacional de Defesa da Democracia, criada no atual governo e que tem entre suas funções o “enfrentamento à desinformação sobre políticas públicas”, segundo decreto nº 11.328 de 1º de janeiro de 2023 –íntegra aqui (2 MB).
“Acionamos a AGU contra o ministro Fernando Haddad por desinformar sobre os precatórios e déficit público. Solicitamos investigação e eventual responsabilização pela disseminação de informações falsas. São inaceitáveis as narrativas distorcidas e manipulação de dados fiscais de um governo que tanto acusa seus críticos de fake news“, disse Marinho ao Poder360.
Equipe de Guedes também questiona
A equipe econômica do ex-ministro da Economia Paulo Guedes também contestou os dados apresentados pelo ministro Fernando Haddad.
Segundo a equipe de Guedes, se fosse mantida a mesma “governança fiscal de 2019 a 2022”, o resultado primário do governo central seria “bem melhor” que o previsto no PLOA (Projeto de Lei Orçamentária Anual) de 2023. Citou que em 2022, quando a previsão orçamentária era de um deficit de R$ 59,4 bilhões, o governo Bolsonaro terminou com um saldo positivo de R$ 54,9 bilhões.
Dos R$ 90 bilhões em precatórios –que na realidade são R$ 92 bilhões– só 1/3 do valor se refere a 2022. “O restante se refere aos exercícios de 2023 e 2024 (ou seja, são passivos do governo atual)”, disseram integrantes do time de Guedes em um grupo de mensagens no aplicativo WhatsApp. Segundo eles, os R$ 60 bilhões a mais com o Bolsa Família se referem à promessa de campanha dos 2 candidatos na eleição presidencial e “não à política pública” implementada pela gestão econômica, segundo os integrantes do governo anterior.
CONTAS PÚBLICAS
Os gastos primários caíram no governo Bolsonaro. As despesas primárias recuaram de 19,3% para 19,0% do PIB (Produto Interno Bruto). “Foi a 1ª vez desde a redemocratização que um presidente deixa para seu sucessor um gasto menor que o herdado do governo anterior”, disse a equipe econômica.
Declarou ainda que o resultado nominal do setor público consolidado –que inclui União, Estados, municípios e estatais– passou de um deficit acumulado em 12 meses de R$ 460,4 bilhões em dezembro de 2022 para R$ 967,4 bilhões até dezembro de 2023. A piora foi de R$ 507 bilhões no período. No último resultado disponível, o deficit nominal era de R$ 998,6 bilhões no acumulado de 12 meses até março.
O resultado nominal do setor público consolidado considera o pagamento dos juros da dívida pública. O resultado primário exclui a despesa com juros. A seguir, o Poder360 apresenta 2 infográficos que têm o cálculo do deficit com e sem os gastos com juros.
Quando se consideram as despesas com pagamento de juros (agravadas pela taxa Selic que está acima de 10% ao ano já há algum tempo), o resultado do deficit nominal é este, de R$ 998,6 bilhões (dado mais recente):
Quando se considera o resultado do deficit primário, que não inclui o pagamento dos juros da dívida, o resultado em 12 meses sai de um superavit de R$ 126,0 bilhões (em dezembro de 2022) para um deficit de R$ 249,1 bilhões. Ou seja, mesmo que sejam expurgados os gastos com juros, há uma piora de R$ 375,1 bilhões no período mais recente do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
No último dado disponível, o deficit primário (sem a conta de juros) foi de R$ 252,9 bilhões (12 meses terminados em março de 2024), como mostra o infográfico:
Já o ritmo diário de endividamento aumentou de R$ 0,7 bilhão por dia para R$ 2,3 bilhões diários. A dívida bruta já subiu R$ 1 trilhão sob Lula. Há o efeito claro da conta dos juros nesse resultado, mas há também aumento de despesas em geral que contribuíram para a piora do resultado fiscal –e é isso que argumentam integrantes da equipe econômica do ex-ministro Paulo Guedes.
O Poder360 informou ao Ministério da Fazenda sobre a representação e perguntou se havia interesse em enviar algum comentário. A Fazenda não respondeu. O espaço segue aberto para manifestação, que será publicada assim que for eventualmente recebida.