Saiba como software usado pela USP faz a contagem de público

O ato do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) reuniu dezenas de milhares de pessoas na av. Paulista, em São Paulo, em 25 de fevereiro de 2024. O número de apoiadores presentes à manifestação causou debate. 

Eis as estimativas de público divulgadas:

  • pesquisadores da USP (Universidade de São Paulo) estimaram em 185 mil no horário de maior concentração de público da manifestação, às 15h (usaram um software);
  • o Poder360 calculou de 300 mil a 350 mil (leia mais abaixo a metodologia usada);
  • a Polícia Militar de São Paulo falou em 750 mil, número próximo da expectativa de aliados de Bolsonaro (não divulgou a metodologia).

A estimativa da USP foi realizada pelo grupo Monitor do Debate Político no Meio Digital, da EACH (Escola de Artes, Ciências e Humanidades). Os pesquisadores usaram o software chinês “Point to Point Network”. O programa foi lançado em 2021, na International Conference on Computer Vision, conferência realizada em Montreal, no Canadá.

O Point to Point Network estima quantas pessoas estavam em um evento a partir de imagens aéreas, tiradas por drone (os pesquisadores da USP contratam um serviço para fazer as fotos), em alta resolução. O software seria capaz de identificar as cabeças, marcá-las como “pontos” e a partir disso fazer a contagem.

Segundo o pesquisador Márcio Moretto, um dos coordenadores do Monitor do Debate Político no Meio Digital, o Point to Point Network foi escolhido porque “apresentava os melhores valores de precisão e acurácia para identificação de cabeças em fotos de multidão”.

O que os pesquisadores fizeram para estimar o público na Paulista:

  • 43 fotos aéreas foram tiradas das 15h às 17h;
  • 11 fotos, cobrindo a extensão da manifestação, foram selecionadas;
  • cada uma das 11 fotos foi dividida em 8 quadrantes, e cada quadrante foi analisado pelo software.

O método tem precisão de 72,9% e acurácia de 69,5% na identificação de cada indivíduo. Na contagem de público, o erro percentual absoluto médio é de 12% para mais ou para menos para imagens aéreas com mais de 500 pessoas. O software, no entanto, não é identifica pessoas embaixo de estruturas como marquises ou de árvores.

Copyright

Reprodução

Nas imagens da esquerda, fotos de multidões; e nas da direita, a identificação feita pelo software (cada ponto vermelho representaria uma cabeça, ou uma pessoa)

Assista aos vídeos do ato de Bolsonaro na av. Paulista (6min6s):

TREINAMENTO DO SOFTWARE

O software é de código aberto e pode ser baixado aqui. Trata-se de uma versão “crua”. De acordo com os pesquisadores da USP, é preciso alimentar e treinar o programa com imagens de multidões. O objetivo é tentar reduzir imprecisões no cálculo, como:

  • uma pessoa ser contabilizada mais de uma vez;
  • um objeto ou estrutura ser confundido como sendo uma pessoa;
  • uma pessoa não ser identificada pelo software.

“Você treina esse software e, por isso, a margem de erro varia conforme a alimentação. Nós treinamos o programa desde 2022 com nossas fotos mais antigas e atuais. Assim, reduzimos a margem de erro, que era de 20% em 2022, para 12% neste ano”, afirmou Moretto.

Os pesquisadores da USP já usaram Point to Point Network para realizar estimativas de público em 8 eventos de agosto de 2022 até fevereiro de 2024. Saiba quais são na lista abaixo e o público estimado pelo software chinês:

  • 11.ago.2022: ato pela democracia no Largo São Francisco (SP) – 7.600;
  • 21.ago.2022: ato da campanha Lula no vale do Anhangabaú (SP) – 9.580;
  • 7.set.2022: ato do 7 de Setembro na av. Paulista (SP) – 32.700;
  • 7.set.2022: ato do 7 de Setembro na praia de Copacabana (RJ) – 64.600;
  • 2.nov.2022: manifestação em frente ao Comando Militar do Sudeste (SP) – 30.700;
  • 26.nov.2023: ato em memória de Cleriston Pereira, preso no 8 de Janeiro que morreu na cadeia, na av. Paulista (SP) – 13.300;
  • 10.dez.2023: manifestação contra a indicação da Flávio Dino ao STF em Brasília – 5.600;
  • 25.jan.2024: ato em apoio a Bolsonaro na av. Paulista (SP) – 185.000.

CONTAGEM DE PÚBLICO

A contagem do Poder360 estimou de 300 mil a 350 mil pessoas na av. Paulista.

De que forma o jornal digital calculou a estimativa:

  • foi calculada a metragem da área ocupada pelo ato com ajuda do Google Earth;
  • foram analisadas fotos e vídeos da manifestação em seu horário de pico para avaliar a densidade dos locais ocupados;
  • a densidade foi dividida em 3 categorias: baixa (duas pessoas por m²), média (4 pessoas por m²) e alta (6 pessoas por m²).

“O Poder360 estima o público pela concentração e densidade. O que fazemos é um pouco diferente. Fazemos uma foto área de toda a extensão e usamos o software, o qual contabiliza o número de pessoas”, afirmou Moretto.

Moretto disse não ser possível analisar a estimativa de 750 mil pessoas da PM de São Paulo pelo fato de a metodologia não ter sido informada: “Não é que o número da corporação esteja errado, mas como não há a divulgação dos dados, não temos como contrapor”.

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