Brasileiros escreveram manifestações via Lei de Acesso ao INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) com relatos dos desvios cometidos por sindicatos e associações em benefícios previdenciários.
As menções às fraudes foram realizadas antes da operação da Polícia Federal que mostrou em abril de 2025 o desvio de aproximadamente R$ 6,5 bilhões por meio de esquema de retenção indevida de 2019 a 2024.
Os textos foram enviados pelos cidadãos tanto durante os governos de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) quanto durante a gestão de Jair Bolsonaro (PL). Mencionavam descontos indevidos por associações que não teriam autorização para retirar o dinheiro.
A resposta do órgão costumava ser padrão, com orientações de como solicitar a exclusão dos descontos por meio dos canais oficiais da ferramenta Meu INSS. Dizia que a Lei de Acesso não poderia ser considerada um canal oficial para relatar crimes.
“Caso se sinta prejudicado por operações irregulares, ou descontos não autorizados, solicitamos que também seja registrada reclamação na Ouvidoria Previdenciária, a qual pode ser realizada por telefone através da Central de Atendimento 135”, lê-se em uma das respostas.
Os órgãos têm que fazer relatórios sobre todos os pedidos que recebem. Ou seja, estavam cientes das descrições –por mais que tivessem capacidade limitada de reação nos canais de informação.
O Poder360 compilou exemplos das manifestações por meio da página Busca de Pedidos e Respostas na galeria abaixo. O site não fornece uma forma de fazer download de todos os requerimentos. Apesar disso, ao pesquisar por “descontos INSS”, cerca de 10.000 itens estão disponíveis para checagem.
Relatos de desvios do INSS via Lei de Acesso à Informação
Muitos dos textos mencionam nominalmente algumas associações agora investigadas pela PF e pela CGU (Controladoria Geral da União) como atuantes nas fraudes com desvios estimados em 2024, como:
- Aapen – R$ 178,6 milhões;
- Conafer – R$ 277,1 milhões.
O Poder360 procurou ambas as entidades por e-mail para perguntar se gostariam de se manifestar a respeito da operação sobre os desvios. A mensagem foi enviada às 19h34 desta 3ª feira (6.mai). Não houve resposta até a publicação desta reportagem. O texto será atualizado caso uma manifestação seja enviada a este jornal digital.
Leia abaixo os valores calculados pela CGU (clique aqui para abrir em outra aba):
A Lei de Acesso à Informação (nº 12.527 de 2011) dá o direito de qualquer cidadão solicitar e receber informações públicas de órgãos e entidades dos Três Poderes em todas as esferas de governo.
Um pedido via Lei de Acesso a nível federal é realizado mais usualmente pelo portal Fala.BR. É necessário fazer login com o gov.br e detalhar a solicitação. Há opção de se manter no anonimato. A resposta deve vir em até 20 dias, que podem ser prorrogados.
FRAUDE BILIONÁRIA NO INSS
Segundo a Polícia Federal, sindicatos e associações realizavam um ACT (Acordo de Cooperação Técnica) com o INSS para oferecer benefícios aos aposentados associados.
Os serviços incluíam:
- auxílio jurídico;
- desconto no plano de saúde;
- auxílio funerário.
O acordo permitia que as entidades realizassem um desconto de “mensalidades associativas” na folha de pagamento dos beneficiários.
Tais entidades cadastraram os aposentados sem a autorização, utilizando documentos e assinaturas falsas. As investigações indicam que não tinham estrutura para manter os serviços oferecidos.
Com isso, falsificavam assinaturas para associar o pensionista a entidades e realizar os descontos automáticos na folha de pagamento dos beneficiários.
A controladoria também identificou que 70% das 29 entidades analisadas não entregaram a documentação completa ao INSS.
Na operação, 6 pessoas foram afastadas de suas funções:
- Alessandro Stefanutto – presidente;
- Virgílio Ribeiro de Oliveira Filho – procurador-geral do INSS;
- Vanderlei Barbosa dos Santos – diretor de Benefício junto ao Cidadão;
- Giovani Batista Fassarella Spiecker – coordenador-geral de Suporte ao Atendimento ao Cliente;
- Jucimar Fonseca da Silva – coordenador-geral de Pagamentos e Benefícios;
- policial federal – identidade não foi divulgada.
A PF informou que apreendeu carros de luxo, dinheiro em espécie, joias e quadros. Os valores totais e a quantidade exata ainda estão em levantamento.
Eis algumas informações do governo:
- como funciona o desconto de mensalidades –“As entidades de classe, como associações e sindicatos, formalizam Acordos de Cooperação Técnica com o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social). Esses acordos permitem que as entidades realizem descontos de mensalidades associativas diretamente na folha de pagamento dos beneficiários do INSS, desde que autorizados pelos aposentados e pensionistas.”;
- autorização do beneficiário –“Para que o desconto seja realizado, a entidade precisa da autorização expressa e individual de cada beneficiário para realizar o desconto de sua mensalidade associativa. Na investigação, foram identificadas, porém, a ausência de verificação rigorosa dessa autorização e a possibilidade de falsificação de documentos de filiação e autorização.”
COMPENSAR AS PERDAS
Há duas opções centrais que a gestão de Lula pode seguir para pagar as perdas dos beneficiários:
- recuperar o dinheiro com as entidades – improvável que seja possível em um prazo de curto a médio prazo;
- bancar do próprio bolso – utilizar dinheiro dos cofres públicos para pagar ao menos uma parte dos R$ 6,5 bilhões.
A Previdência tem um Orçamento trilionário. O impacto é considerado relativamente marginal, mas não deixa de ser um desgaste forte para o governo com o eleitorado.
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