A discussão sobre a reforma tributária no Brasil coloca em campos opostos o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Enquanto a administração petista tenta emplacar a agenda de forma mais branda, sem alterar a Constituição, o deputado alagoano quer dar sequência à discussão da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 32 de 2020, enviada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) em setembro daquele ano.
Lira deu sinais no final de 2023 de que essa seria uma das agendas prioritárias para 2024, último ano em que estará como presidente da Câmara. No entanto, a avaliação de líderes partidários é de que com a eleição municipal em outubro, as chances de avançar no tema são baixas.
A proposta defendida por Lira reduz a estabilidade dos servidores. O governo é contra esse ponto. O presidente da Câmara, embora queira andar com a reforma, reconheceu publicamente que o apoio do governo faria diferença. Alertou, contudo, que caso o Planalto não desse opiniões, a pauta eventualmente acabaria andando na Casa Baixa.
O governo, por sua vez, quer alterações infralegais. Avalia não haver a necessidade de apresentar alguma proposta de emenda constitucional. Descarta abertamente a PEC 32 de 2020.
O Ministério da Gestão e Inovação está à frente das mudanças. A ministra Esther Dweck evita falar em reforma administrativa. Menciona “transformação do Estado”.
Leia abaixo como são atualmente alguns pontos e as diferenças entre o que a Câmara defende e o que quer o governo Lula:
- demissão – funcionários públicos só são desligados em caso de comprovação de ilegalidades.
- o que o governo quer – manter a estabilidade e o desligamento só em casos de ilegalidade;
- o que a Câmara defende – permitir a demissão de funcionários públicos, incluindo por ineficiência de desempenho.
- promoções – atualmente funcionários públicos podem ter progressão ou promoção por tempo de serviço.
- o que o governo quer – atrelar à capacitação, desempenho, tempo de serviço e antiguidade;
- o que a Câmara defende – acabar com o adicional por tempo de serviço.
- cargos de confiança – a função é determinada pela Constituição.
- o que o governo quer – limitar remunerações fora do teto e fixar percentuais para auxílio;
- o que a Câmara defende – acabar com os “cargos em comissão de livre provimento e exoneração” e as “funções de confiança”.
- mudança de jornada – atualmente não há obrigatoriedade na legislação de redução de salário em caso de redução de jornada.
- o que o governo quer – flexibilizar jornada ao substituir carga horária por entrega de resultados; planos de trabalho ineficientes resultam em desconto na folha;
- o que a Câmara defende – reduzir o salário em caso de redução de jornada.
- férias – atualmente há férias maiores de 30 dias para professores e funcionários da saúde que operam raio-x.
- o que o governo quer – manter como é hoje;
- o que a Câmara defende – proibir férias de mais de 30 dias.
- aposentadoria – não há idade limite para funcionários públicos.
- o que o governo quer – manter como é hoje;
- o que a Câmara defende – tornar obrigatória quando o empregado público completar 75 anos.
O secretário de Gestão de Pessoas do ministério, José Celso Cardoso Júnior, disse em 10 de janeiro que a equipe econômica trabalha para “evitar aumentar o aumento de gastos com a máquina fazendo uma reorganização interna”.
Há uma aposta na melhoria do serviço público a partir da busca pela eficiência. Isso passa pela flexibilização do trabalho: a burocracia do ponto dá lugar à entrega de resultados.
Caso o plano de trabalho seja considerado insuficiente, pode haver corte na folha salarial. A proposta, contudo, é embrionária.
O Poder360 apurou que o governo não trabalha com prazo e a avaliação é de que as mudanças são contínuas e cumulativas. A reestruturação de carreiras busca reduzir a disparidade salarial entre categorias diferentes com atribuições similares.
A progressão, por sua vez, está atrelada à capacitação e ao desempenho, tempo de serviço e antiguidade.
CONCURSOS
Dweck também avalia que a realização de concursos a cada 2 anos integra as alterações. Em 2024, o governo realizará o Concurso Nacional Unificado, conhecido informalmente como “Enem dos Concursos”. Serão 6.640 vagas ofertadas e o impacto estimado nas contas públicas por ano é de R$ 2 bilhões. Os valores estão previstos no Orçamento.
As mudanças na estrutura do Estado, no entanto, podem resultar em elevação de gastos. “Essa é uma diferença crucial entre a visão do governo anterior e a nossa sobre reforma administrativa. Se a reforma administrativa é melhorar o desempenho do Estado, a capacidade de entregar políticas públicas, de atender a população, isso não necessariamente significa redução de custo da máquina pública. Pode ser que signifique aumento, inclusive”, declarou Cardoso Júnior.
Assim, contraria o que pensa Lira sobre uma reforma administrativa, que implicará obrigatoriamente em corte de despesas.
COMBATE AOS SUPERSALÁRIOS
Existe ao menos 1 ponto em comum entre a Câmara e o governo Lula: a limitação aos supersalários do funcionalismo público.
O Executivo apoia o projeto de lei 6.726 de 2016 relacionado ao tema. É favorável à fixação de percentuais para auxílios. O texto foi aprovado na Câmara em 2021 e está no Senado.