O procurador-geral da República, Paulo Gonet, pediu na 4ª feira (14.fev.2024) que o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Dias Toffoli reconsidere a decisão que suspendeu provisoriamente os pagamentos do acordo de leniência da Novonor (antiga Odebrecht) ou que a envie para análise do plenário do STF. Eis a íntegra do pedido (PDF – 1,5 MB).
De acordo com Gonet, as mensagens hackeadas de procuradores obtidas pela operação Spoofing da PF (Polícia Federal) mostram “comportamentos censuráveis de agentes públicos”, mas “não revelam prática de nenhum ato que componha o conceito de coação moral” contra a empresa.
Toffoli suspendeu o pagamento de multas no valor de R$ 3,8 bilhões e também autorizou a Novonor a ter acesso às provas colhidas na Spoofing em decisão publicada em 1º de fevereiro de 2024. Ele entendeu que as provas obtidas na operação da PF levantavam dúvidas sobre a voluntariedade no acordo –o que vai contra o que diz a lei para acordos do tipo.
No pedido, Gonet diz que “vontade livre não é aquela isenta de pressões, mas a que se pode formar com a consciência de riscos e vantagens”. Também afirmou que “nada na petição justifica que se tenha como evidenciado o cancelamento dessa vontade a ponto de justificar a suspensão das obrigações assumidas pela Novonor”.
Gonet destacou ainda que tanto a Novonor quanto seus executivos “sempre puderam dispor da melhor assessoria jurídica, administrativa, contábil e de relações públicas” disponível.
ACORDOS DE LENIÊNCIA
O acordo de leniência é um mecanismo em que empresas que cometeram atos danosos à administração pública colaboram com as apurações e se comprometem a pagar os valores estipulados no contrato, ressarcindo os valores acordados aos cofres públicos. Além disso, as organizações devem estabelecer internamente programas de aperfeiçoamento de integridade.
A Odebrecht firmou 2 acordos de leniência no Brasil:
- em 2016, com o MPF (Ministério Público Federal), no valor de R$ 3,8 bilhões (R$ 8,5 bilhões corrigidos pela inflação ao longo de 20 anos de pagamento)–que deveriam ser repartidos entre o próprio MPF, o Departamento de Justiça dos EUA e a Procuradoria Geral da Suíça. Eis a íntegra do acordo (PDF – 2 MB);
- em 2018, com a AGU (Advocacia Geral da União) e a CGU (Controladoria Geral da União), no valor de R$ 2,7 bilhões (R$ 6,8 bilhões corrigidos pela inflação ao longo de 22 anos). Até este sábado (13.jan.2024), só R$ 172,7 milhões haviam sido pagos, segundo o painel de dados da CGU. Eis a íntegra do acordo (PDF – 318 kB).
Depois dos acordos, o grupo teve que entrar em recuperação judicial e passar por uma reestruturação.
OPERAÇÃO SPOOFING
A operação foi deflagrada em 2019 para investigar hackers que divulgaram trocas de mensagens entre o ex-coordenador da Lava Jato no Paraná, Deltan Dallagnol (Novo-PR), e o ex-juiz (e hoje senador) Sergio Moro (União Brasil-PR), no episódio que ficou conhecido como Vaza Jato.
As conversas obtidas pelos invasores serviram de subsídio para a defesa de diversos investigados –e presos– pela Lava Jato, como o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Em 14 de junho de 2023, o STF proibiu a destruição de provas obtidas dos celulares de Moro e de Dallagnol.
Um dos hackers envolvidos na Vaza Jato é Walter Delgatti Neto, preso em 2019 por suspeita de invadir contas de autoridades no Telegram, incluindo a de Sergio Moro quando já era ministro da Justiça e Segurança Pública do governo Jair Bolsonaro.
Em 2023, quando já estava fora da cadeia, Delgatti afirmou que passou a trabalhar para a deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) em 2022 e que recebeu de hackear os dispositivos do ministro do STF Alexandre de Moraes. Ele foi ouvido na CPI do 8 de Janeiro.