Novas mensagens do gabinete do ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), demonstraram descontentamento do gabinete com a atitude da Interpol (sigla em inglês para Organização Internacional de Polícia Criminal) diante do caso que envolve Allan dos Santos, jornalista, blogueiro e influenciador digital simpatizante de Jair Bolsonaro (PL). A conversa, divulgada neste sábado (18.ago.2024) pela Folha de S. Paulo, provocou a reação de políticos de direita.
Em seu perfil do X (ex-Twitter), o próprio ex-presidente criticou o conteúdo do diálogo entre 2 juízes instrutores do magistrado: um do Supremo, Airton Vieira, e outro do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), Marco Antônio Vargas. “Puro suco de democracia, respeito às leis, processo legal e tudo que se vê em todo lugar que não dão inveja à uma Venezuela ou à uma Nicarágua”, escreveu Bolsonaro.
Os magistrados estavam insatisfeitos com a demora da Interpol em emitir alerta vermelho contra Santos –solicitação para autoridades policiais localizarem e prenderem uma pessoa enquanto ela aguarda extradição, rendição ou ação legal semelhante.
Em um momento, Vargas classificou como “sacanagem” as atitudes dos EUA e da Interpol. “Com certeza. Por isso esse idiota do Allan dos Santos se sente livre para fazer o que faz”, afirmou Vieira. “Dá vontade de mandar uns jagunços pegar esse cara na marra e colocar num avião brasileiro”, declarou Vargas.
O deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) criticou a fala: “Não é sobre eleições, muito menos democracia, mas sim utilizar de um tribunal como instrumento de perseguição política”.
O também deputado federal Marcel van Hattem (Novo-RS) cobrou uma ação do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-RO): “São capangas mesmo! Acabam de sair novas informações na Folha de S.Paulo sobre os abusos e ilegalidades cometidos pelos juízes auxiliares –CAPANGAS!– de Alexandre de Moraes”, afirmou.
Segundo a reportagem, as mensagens são de novembro de 2022. À época, Allan dos Santos foi filmado em manifestação contra ministros do STF que participavam de um evento em Nova York (EUA). “Peça para o Airton falar com a PF [Polícia Federal] sobre o alerta vermelho”, escreveu Vargas.
LEIA AS MENSAGENS DO GABINETE DE MORAES
Na conversa de novembro de 2022, Vieira falou, em áudio, sobre a inclusão do nome de Allan dos Santos na Difusão Vermelha da Interpol.
“A questão do alerta vermelho é uma longa história, mas em resumo é o seguinte: o pedido do alerta vermelho já foi feito há mais de ano, só que ele [o pedido] está em Lyon [França], que é a sede da Interpol. E o pessoal de lá até agora não atendeu, simplesmente se recusou a pôr e de nada adiantaram os pedidos reiterados feitos pela Interpol aqui do Brasil”, declarou.
Conforme Vieira, o escritório da Interpol na França deu a entender “que a questão poderia ter viés político”. Disse: “Nós estamos pedindo, eles não colocaram. Isso fez com que, aliás, o Allan dos Santos não fosse preso até agora”.
“O escritório central da Interpol, em Lyon, não coloca o nome dele no alerta vermelho. Os EUA não respondem ao pedido de extradição, que já foi feito, com base até na prisão preventiva dele decretada. A situação é essa”, declarou Vieira.
Marco Antônio Vargas disse que nem iria “responder ao ministro” sobre a questão envolvendo a Interpol, pois Moraes “deve saber bem essa história”.
Vieira, então, declarou: “Sim, conhece essa história em detalhes. Não se conforma, com toda a razão. Mas nada podemos fazer quanto a essa questão da Interpol, assim como com a questão da extradição. Tudo o que podíamos fazer foi feito, seguimos todo o trâmite. Mas a Interpol em Lyon engavetou o pedido de alerta vermelho e os EUA não resolvem a questão da extradição. Difícil”.
Em outra mensagem, Vargas classificou como “sacanagem” as atitudes dos EUA e da Interpol.
“Com certeza. Por isso esse idiota do Allan dos Santos se sente livre para fazer o que faz”, afirmou Vieira.
“Dá vontade de mandar uns jagunços pegar esse cara na marra e colocar num avião brasileiro”, disse Vargas.
Vieira voltou a criticar os EUA. Em áudio, declarou: “Se eles [norte-americanos] quiserem te mandar embora porque não gostaram dos seus olhos, eles inventam um pretexto qualquer e colocam você no 1º avião de volta e deportam, extraditam, dão pé no traseiro, o nome que você quiser, mas eles fazem o que eles bem entenderem com quem eles quiserem. Do contrário, não há governo no mundo que determine o que eles têm que fazer”.
Continuou: “Eles têm o tempo deles, os interesses deles, esse é o problema todo, essa é a questão”. E completou: “Se, para nós, o Allan dos Santos tem alguma importância, para eles a importância é zero. Então, eles não vão comprar uma dor de cabeça com o governo do Brasil, em que pese o governo do Brasil ser de outra orientação. Talvez a partir de 1º de janeiro [de 2023, com a posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PT)] a coisa mude, não sei”.
Procurado pela Folha, o gabinete de Alexandre de Moraes disse que “todos os procedimentos foram oficiais, regulares e estão devidamente documentados nos inquéritos e investigações em curso no STF, com integral participação da Procuradoria Geral da República”.
Em março deste ano, as autoridades norte-americanas comunicaram que seguiriam parcialmente com o pedido de extradição. Integrantes do governo dos EUA solicitaram mais informações sobre os crimes que Allan é investigado.
Em documento ao Ministério da Justiça, as autoridades norte-americanas dizem “compreender” a importância do tema e se comprometem em analisar com celeridade depois do envio dos materiais.
Leia mais: