Os governadores de 6 Estados do Sul e do Sudeste sinalizaram apoio à proposta do ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, de ampliar as prerrogativas do governo federal na segurança pública por meio de uma PEC (proposta de emenda à Constituição). Reforçaram, porém, que a autonomia dos Estados na área, principalmente em relação às polícias civil e militar, deve ser preservada.
O grupo é formado por políticos de oposição ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), exceto o governador do Espírito Santo, Renato Casagrande, do PSB, mesmo partido do vice-presidente Geraldo Alckmin. Ainda assim, indicaram estarem dispostos a dialogar com o governo federal sobre o tema.
“Eu acho muito importante a gente tirar esse componente político, sobretudo desse debate, que é um debate fundamental sobre que Brasil nós queremos nos próximos anos”, disse o governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL). A declaração foi dada na 5ª feira (8.ago.2024) a jornalistas durante a abertura a 11ª edição do Cosud (Consórcio Integrado do Sul e Sudeste), realizado na região de Pedra Azul, no Espírito Santo.
Participam do evento os governadores:
- Tarcísio de Freitas (Republicanos), governador de São Paulo;
- Cláudio Castro (PL), governador do Rio de Janeiro;
- Eduardo Leite (PSDB), governador do Rio Grande do Sul;
- Romeu Zema (Novo), governador de Minas Gerais;
- Renato Casagrande (PSB), governador do Espírito Santo;
- Jorginho Mello (PL), governador de Santa Catarina.
O governador do Paraná, Ratinho Jr. (PSD), participará a partir desta 6ª feira (9.ago). O encontro se encerra no sábado (10.ago).
Castro afirmou que a diferenciação entre governo e oposição é papel do Congresso. “O papel de quem governa, de quem é sobretudo do Poder Executivo, é de trabalhar juntos e achar essas soluções”, disse.
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), afirmou que a PEC deve ser apoiada porque está sendo apresentada com o intuito de “conjugar esforços, coordenar, cooperar e trocar informações”. “E quando ela [a PEC] vem nesse sentido ela tem que ser obviamente apoiada”, disse.
O governador do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB), por sua vez, afirmou que todos do grupo estão alinhados de que “o papel do governo federal pode se ampliar, pode agir e pode atuar no sentido de ter uma participação mais presente com relação ao combate à criminalidade”.
Questionados diretamente pelo Poder360 se aceitariam se reunir com Lula para tratar da proposta, nenhum governador respondeu de forma explícita que sim. Embora tenham demonstrado apoio ao texto, indicaram que a interlocução será feita primordialmente com Lewandowski.
“É fundamental que todos possamos dar ao ministro Lewandowski o apoio total, ainda mais quando se ouve do ministro que todos nós seremos ouvidos. Essa abertura do diálogo é fundamental. […] Por isso, ministro, eu que sou de um partido que não está junto governando, queria dar todo meu apoio para que a gente pudesse resolver ou, pelo menos, encaminhar soluções práticas para esse problema”, disse Castro.
A distância que os governadores de oposição tomaram de Lula mostra como o presidente ainda tem dificuldade em estreitar a relação de seu governo com as gestões estaduais passado 1 ano e meio do 3º mandato. O governante expressou tal insatisfação em 26 de julho durante anúncio de recursos para obras do Novo PAC. Disse que os governadores de oposição não vão aos eventos que ele os convida por causa de uma visão “negativista” do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Lewandowski apresentará formalmente nesta 6ª feira (9.ago) os detalhes técnicos da proposta aos governadores. Na noite de 5ª feira (8.ago), durante um jantar com o grupo, adiantou pontos do texto e ouviu ponderações. Lewandowski é o único representante do governo federal a participar do encontro. A jornalistas, disse que a PEC não fará “qualquer ingerência” na autonomia dos Estados e municípios na área da segurança pública.
“Não vai mexer com a Polícia Civil, com a Polícia Militar e muito menos com os guardas municipais. Queremos é uma coordenação de esforços. Não podemos conviver com 27 boletins de ocorrência diferentes, 27 mandados de prisão diferentes, 27 certidões de antecedentes criminais diferentes. Precisamos unificar a linguagem, a terminologia, ter um banco único de dados para enfrentar o crime organizado”, disse.
O ministro apresentou a PEC a Lula na 4ª feira (7.ago) em reunião com ministros que já foram governadores. A proposta é inspirada no SUS (Sistema Único de Saúde) e visa constitucionalizar a atuação federal na área.
Aos governadores, Lewandowski disse que o presidente se convenceu da necessidade de incluir o tema na Constituição, assim como estão os temas da educação e da saúde.
Há uma lei ordinária que criou o Susp (Sistema Único da Segurança Pública), com a União como coordenadora. Mas o governo quer que a atuação federal esteja na Constituição para dar mais efetividade à ação do Executivo. Lewandowski afirmou na 4ª feira (7.ago) que a Justiça fez uma minuta de PEC sobre o tema só com tecnicalidades, que precisará ser complementada com a visão política.
Lula quer se reunir com os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e do STF (Supremo Tribunal Federal), ministro Roberto Barroso, além dos 27 governadores, para discutir a possível mudança constitucional. Só depois dessas conversas é que o texto deverá ser enviado para análise do Legislativo.
Leia o que cada governador falou sobre o assunto:
Romeu Zema (Novo)
“O que queremos sempre é o diálogo. Sempre fui da opinião de que situações distintas precisam de tratamentos distintos. Não conheço a PEC em profundidade, será analisada, será debatida. E estou convicto de que o contraditório é muito bom porque, às vezes, você acaba encontrando um 3º caminho, não o das duas partes, às vezes algo até melhor. Estou confiante que esse diálogo irá prevalecer, que o Congresso irá analisar profundamente com especialistas.”
Cláudio Castro (PL)
“Essa questão de oposição e governo é papel do Parlamento, do Congresso Nacional. O papel de quem governa, de quem é sobretudo do Poder Executivo, é de trabalhar juntos e achar essas soluções. É óbvio que a gente pode ter discordâncias, mas isso não é na perspectiva de ser oposição ou situação, acho que a nossa perspectiva de convergência ou de divergência é de achar um projeto melhor. Eu acho muito importante a gente tirar esse componente político sobretudo desse debate que é um debate fundamental sobre que Brasil nós queremos nos próximos anos. É fundamental que todos possamos dar ao ministro Lewandowski o apoio total, ainda mais quando se ouve do ministro que todos nós seremos ouvidos. Essa abertura do diálogo é fundamental.”
Jorginho Mello (PL)
“Santa Catarina é um Estado privilegiado, somos um dos Estados mais seguros do Brasil pela qualificação da nossa polícia, mas os Estados sofrem porque se agiganta cada dia essa criminalidade. Então é um assunto de todos nós. As fronteiras precisam ser mais guarnecidas, isso depende do apoio do governo federal. […] Discutir princípios, discutir forma de se fazer mais rapidamente o boletim de ocorrência. […] É um assunto que tem que ser pautado, discutido e o Cosud é um palco onde a gente discute as grandes dificuldades de cada Estado, de colaborar um com o outro, de sofrer junto e colaborar.”
Eduardo Leite (PSDB)
“A visão sobre um processo de integração e de coordenação que melhore os processos, os fluxos, os sistemas entre as nossas polícias respeitando a autonomia, porque somos operadores lá na ponta desta segurança, a partir das nossas forças policiais – e entendemos que não se deve abrir mão disso -, dessa autonomia do Estado na gestão local, mas sim com a melhor e mais perfeita sincronia também em um sistema integrado de segurança pública nacional que, aí sim, nos permita fazer um tratamento qualificado a um crime que se organiza e que está aí apresentando muita preocupação em relação ao futuro.”
Tarcísio de Freitas (Republicanos)
“Estamos falando do principal tema do Brasil hoje. Eu tenho dito que o principal risco brasileiro hoje é o risco do crime organizado, o risco da violência, o risco da segurança pública. A gente só vai ter sucesso enquanto país, só vamos ter êxito, se a gente conseguir conjugar os esforços, coordenar, cooperar, trocar informações. E é nesse sentido que a PEC está vindo. E quando ela vem nesse sentido ela tem que ser obviamente apoiada. Uma questão fundamental, já foi posta também pelo ministro, é o respeito à autonomia dos Estados. […] Nessa perspectiva, é lógico que todos nós vamos participar e contribuir para que a gente tenha o melhor produto possível.”
Renato Casagrande (PSB)
“Está claro que tem toda a manifestação aqui, uma manifestação de boa vontade, de apoio, de colaboração, dentro desse princípio de coordenação, dentro do princípio de compartilhamento das ações, das definições e padronização de documento de procedimentos. […] Todos nós aqui estamos alinhados de que o papel do governo federal pode se ampliar, pode agir e pode atuar no sentido de ter uma participação mais presente com relação ao combate à criminalidade.”
Consórcio Integrado do Sul e Sudeste
A 11ª edição do chamado Cosud é realizado entre 8 e 10 de agosto na região de Pedra Azul, no Espírito Santo. Os governadores e seus secretários discutirão principalmente a necessidade de adaptação às mudanças climáticas, a reforma tributária e segurança pública, tema que teve destaque nas edições anteriores.
Serão realizadas reuniões de 14 grupos de trabalho sobre:
- Agricultura e Pecuária
- Defesa Civil e Meio Ambiente
- Desenvolvimento Econômico, Parcerias e Fomentos
- Direitos Humanos, Juventude e Política para as Mulheres
- Educação
- Esportes
- Governança, Procuradoria e Planejamento
- Infraestrutura, Logística e Desenvolvimento Urbano
- Inovação e Governo Digital
- Saúde
- Segurança
- Turismo
- Fazenda, Previdência e Controladoria
- Cultura
A repórter Mariana Haubert viajou ao Espírito Santo a convite do governo do Estado.