Reviravolta para Bolsonaro em 2026 é “improvável”, dizem especialistas

Aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ainda o tratam publicamente como opção viável para concorrer na eleição presidencial de 2026, mesmo com sua inelegibilidade até 2030. Apesar das declarações de apoio, especialistas ouvidos pelo Poder360 veem como “difícil” e “improvável” uma reviravolta em sua situação eleitoral até lá.

Declarações favoráveis ao ex-presidente remontam desde 2023, ano em que o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) determinou que o ex-chefe do Executivo não poderia concorrer nas próximas 3 eleições. Mas o apoio de seu entorno político se tornou ainda mais evidente no início de julho, durante a Cpac (Conferência de Política Ação e Conservadora) Brasil.

Em discurso, o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) disse que “se as coisas mudarem daqui para a frente”, ele teria 3 opções para 2026: “Jair, Messias e Bolsonaro”, além de afirmar que não existiriam substitutos para ocupar o lugar do ex-presidente.

Outros apoiadores que discursaram também demonstraram ser partidários da ideia, como o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), que disse que o ex-presidente é o líder da direita

Em junho, o senador Ciro Nogueira (PI), presidente do PP (Partido Progressistas), foi na mesma linha, ao dizer que a direita “só tem plano A: Bolsonaro” para a corrida eleitoral de 2026. 

Para que a aposta se concretize, será necessário que Bolsonaro consiga reverter duas condenações no TSE que o tornaram inelegível. O sucesso, no entanto, é baixo, segundo avaliam especialistas. 

CONDENAÇÕES NO TSE

A 1ª decisão é de junho de 2023, quando o colegiado da Corte eleitoral decidiu barrar sua elegibilidade por 8 anos, a contar a partir de 2022, por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação, depois de Bolsonaro criticar o sistema eleitoral brasileiro e a atuação do STF (Supremo Tribunal Federal) durante reunião com embaixadores em 2022.

A 2ª diz respeito a julgamento sobre a comemoração dos 200 anos da Independência do Brasil, em 7 de setembro de 2022. Neste julgamento, de outubro de 2023, além de o TSE condenar Bolsonaro novamente, a mesma determinação de inelegibilidade foi estendida ao general Walter Braga Netto, ex-candidato à vice-presidente. 

Como o ex-presidente estava inelegível, a pena não se somou à outra vigente, o que não exclui a condenação. O advogado constitucionalista Eduardo Ubaldo Barbosa explica que, em uma situação hipotética de reversão da 1ª condenação, a que veio em seguida ainda estaria valendo e Bolsonaro continuaria inelegível.

“Para se livrar mesmo da inelegibilidade em 2026, ele [Bolsonaro] teria que anular as duas condenações porque são duas considerações distintas. Elas não são cumulativas, por isso ele não está inelegível por 16 anos, mas sim por 8. Mas se ele conseguir reverter uma delas, segue inelegível pela outra”, afirma Barbosa. 

OPÇÕES LIMITADAS

Para poder concorrer na disputa eleitoral de 2026, Barbosa avalia que há poucas opções disponíveis para a defesa do ex-presidente que fogem ao que já foi feito. Segundo ele, em decisões da Corte Eleitoral, cabe recurso a ser analisado pelo próprio TSE. 

Apesar de direcionados ao STF, os pedidos precisam ser analisados pelo TSE antes de ser despachados ao Supremo. 

Tais recursos já foram apresentados, mas em ambos os casos, tanto do julgamento da reunião com embaixadores, quanto o da comemoração da Independência, o presidente da Corte Eleitoral, Alexandre de Moraes, negou o provimento. Cabe também, segundo o advogado, protocolar um agravo de recurso extraordinário diretamente ao STF.

No caso da reunião com embaixadores em 2022, o recurso está na 1ª Turma do Supremo sob a relatoria do ministro Luiz Fux. Foi apresentado pela defesa do ex-presidente em dezembro de 2023 (íntegra – PDF – 581 kB) e aguarda julgamento. 

“Considerando o histórico do Supremo, é muito difícil que os ministros se animem a examinar o mérito da decisão do TSE e a tendência é que o colegiado indique que não houve ofensa [pela decisão] à Constituição“, diz Barbosa.

Uma vertente citada por Barbosa que pode ser adotada pela 1ª Turma é a de entender que houve, na determinação do TSE, algum aspecto jurídico com potencial de se replicar em outros acasos e submeter a questão ao plenário –mas, segundo ele, a possibilidade é remota porque a situação que levou Bolsonaro à inelegibilidade é “muito particular”

A 1ª Turma é composta por 5 ministros. Além de Fux, há Cármen Lúcia, Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin e Flávio Dino. Tanto Cármen quanto Moraes votaram pela inelegibilidade de Bolsonaro no TSE (Cármen e Moraes). Ambos ministros indicados por Bolsonaro, André Mendonça e Nunes Marques, fazem parte da 2ª Turma.

Walber Abra, advogado responsável pelas ações que levaram Bolsonaro à inelegibilidade, diz que a base dos recursos apresentados pela defesa do ex-presidente é a afronta a princípios constitucionais como o contraditório, ampla defesa e devido processo legal. “Não está se discutindo o mérito, está se discutindo outras questões, e, as chances [de provimento] são muito pequenas”, afirma.

Já o advogado constitucionalista e fundador da Academia Brasileira de Direito Constitucional, Flávio Pansieri, analisa a possibilidade de uma decisão favorável ao ex-presidente no STF. 

“O recurso de alguma forma tem na maior parte dos seus elementos temas relacionados não ao mérito da medida, mas passam indiretamente pelo mérito também. E nesta toada, se o STF julgar só as questões quanto à ausência de contraditório, da ampla defesa, só isso já faria com que o Bolsonaro já se tornasse elegível”, diz Pansieri. 

É possível, sim, que o Supremo, dando provimento ao recurso que se encontra pendente de julgamento, Bolsonaro possa vir a ser candidato em 2026. É possível, mas acho improvável”, avalia.

O advogado, que já foi diretor da Escola judiciária Eleitoral do TSE, também aponta para uma 3ª estratégia. Segundo Pansieri, Bolsonaro poderia, ainda, protocolar um pedido de cautelar no momento do registro da candidatura, em 2026. 

“É lógico que uma cautelar concedida monocraticamente teria que ser enfrentada pelo plenário do TSE. Mas é importante lembrar que o TSE que julgará o presidente lá no seu suposto registro de candidatura em 2026 será um TSE absolutamente diferente deste TSE que tornou o presidente inelegível”, afirma. 

ANISTIA 

Apesar da dificuldade jurídica avaliada por especialistas para tentar uma reviravolta na inelegibilidade, ainda há outra opção para o ex-presidente: uma anistia pelo Congresso. 

Em tese, os congressistas podem propor anistiar o ex-presidente, mas não há garantia de que o texto terá tramitação célere, a tempo de permitir que Bolsonaro concorra no próximo pleito presidencial, nem que será aprovado. 

Barbosa diz que por mais que, hipoteticamente, uma suposta anistia seja aprovada, não duraria mais que poucas horas depois de promulgada antes que fosse interposta alguma ação contrária à sua manutenção.

“Eu acho que seria inconstitucional. E fatalmente, tão logo esse projeto de anistia fosse promulgado, seria derrubado”, afirma.

Abra também partilha da posição de que a anistia, apesar de possível, não é um caminho viável. Ele cita o caso de Daniel Silveira, em que o STF anulou a graça concedida ao ex-deputado.

 “O STF, no caso do Daniel [Silveira], já disse que a anistia não pode ser instrumento para se furtar ao cumprimento de uma decisão judicial. Então, mesmo que o Congresso conceda a ele [Bolsonaro], isso vai ser analisado pelo STF e o Supremo pode decidir pela inconstitucionalidade da medida”, afirma.

ESTRATÉGIA POLÍTICA

Barbosa avalia que a retórica dos apoiadores do ex-presidente está mais no campo da estratégia política do que baseada em possibilidades reais. 

“É importante que Bolsonaro siga como um fantasma viável, não deixe morrer e não indique desde logo um substituto, seja de um Tarcisio da vida, o [Romeu] Zema. É importante para os apoiadores que Bolsonaro ainda mobilize a sua base, sabendo que lá na hora “H” ele não poderá ser candidato”, afirma.

Tarcísio de Freitas, inclusive, apesar das declarações públicas do entorno do ex-presidente, já é tido como possível plano “B”, e deve migrar para o PL (Partido Liberal), de Bolsonaro, depois de outubro, com o fim das eleições municipais.

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