A Polícia Federal (PF) deve manter o indiciamento de Anderson Torres, conforme apurou a CNN. O depoimento do ex-ministro da Justiça do governo de Jair Bolsonaro (PL), segundo fontes ligadas à investigação, diverge das evidências obtidas até agora.
Segundo investigadores, Torres afirmou em interrogatório realizado na última segunda-feira (14) que os delegados da PF cedidos ao Ministério da Justiça na época, Alfredo de Souza Lima Coelho Carrijo e Marília Ferreira de Alencar, agiram “por conta própria”, sem sua autorização ou conhecimento.
Ainda no depoimento, Torres teria declarado que nunca solicitou aos delegados a elaboração de qualquer minuta com sugestões de alteração no plano de trabalho das forças policiais durante o período eleitoral.
Para os investigadores, o depoimento do ex-ministro contradiz as declarações da ex-diretora de inteligência do Ministério da Justiça, Marília Alencar.
Nesta semana, ela também prestou depoimento à PF e disse que partiu do ex-ministro Anderson Torres as ordens para orientar ações de policiais federais e da Polícia Rodoviária Federal (PRF) durante o segundo turno das eleições de 2022.
Depoimentos apresentam contradições
A ex-diretora de Inteligência do Ministério da Justiça, Marília Alencar, afirmou em depoimento à PF, nessa terça-feira (15), que partiu de Anderson Torres as ordens para orientar ações de policiais federais e da Polícia Rodoviária Federal (PRF) durante o 2º turno das eleições de 2022, segundo apurou a CNN.
De acordo com as investigações, coube ao setor que ela comandava produzir um mapa com a quantidade de votos que Lula e Bolsonaro tiveram em cada cidade no primeiro turno.
Para os investigadores, há indícios de que esse boletim de inteligência tenha sido usado para orquestrar uma megaoperação da PRF e impedir que eleitores de Lula chegassem aos locais de votação.
A apuração da Polícia Federal começou com uma denúncia relatada por um servidor que estava lotado na Diretoria de Inteligência do Ministério da Justiça, subordinado à Marília.
O analista de cibercrimes foi o responsável por fazer o boletim de inteligência com dados de votos do primeiro turno das eleições. Segundo ele, em depoimento à PF, o pedido para fazer o relatório partiu da chefia imediata dele, a diretora Marília Alencar, que ele “estranhou” a demanda, por isso procurou a PF.
No celular de Marília, a PF encontrou esses mapas e pontos vermelhos no Nordeste, com cidades onde Lula teve expressiva votação no primeiro turno.
A defesa de Marília sustentou que o mapa foi feito em apuração de possível compra de votos em cidades específicas e também tinha votação do então presidente Jair Bolsonaro (PL).
Fontes da PF relataram à CNN que Marília foi uma das investigadas que chegou a cogitar uma colaboração premiada, mas os investigadores consideraram que não havia novos elementos para prosseguir com a delação.
Indiciamento ocorreu em agosto
Torres, Carrijo, Marília e outros três investigados foram indiciados em agosto pela Polícia Federal em um relatório preliminar, acusados de impedir ou restringir a movimentação de eleitores durante o segundo turno das eleições de 2022.
“Ao responder a integralidade dos questionamentos, o ex-ministro demonstrou sua disposição em auxiliar na busca da verdade dos fatos”, informou a defesa do ex-ministro por meio de nota.
Ao indiciar os investigados, a Polícia Federal solicitou autorização para dar continuidade às investigações e realizar novas oitivas, que foram agendadas para esta semana.
Primeiro depoimento
Em maio do ano passado, Anderson Torres prestou o primeiro depoimento sobre o caso. A PF investiga se houve uma ação ordenada para impedir que eleitores propensos a votar no então candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT) — que venceu Bolsonaro — chegassem aos locais de votação no Nordeste no dia da eleição do 2º turno.
O relatório parcial entregue pela PF ao Supremo Tribunal Federal (STF) tem mais de duzentas páginas. Segundo investigadores, os elementos de prova trazem depoimentos, planilhas e mensagens trocadas em grupos de mensagem envolvendo os acusados.
No primeiro depoimento, o ex-ministro disse ter recebido de Marília Alencar um levantamento sobre o resultado do primeiro turno das eleições.
Torres, porém, negou que tenha compartilhado o documento com a PRF ou a PF.
O estado da Bahia registrou vantagem de votos para Lula, na disputa contra Bolsonaro, tanto no primeiro quanto no segundo turno eleitoral.
O ex-ministro admitiu que esteve na Bahia dias antes do segundo turno, conforme documentos revelados pela CNN em maio do ano passado.
Segundo ele, porém, a ida foi para visitar obras da Superintendência da PF baiana. Uma foto com Torres e outros integrantes da PF com capacetes de obra, em frente ao prédio, é apontada como prova pela defesa.
A suspeita da investigação, no entanto, é de que a viagem tenha sido utilizada para que Torres orientasse as ações que a polícia faria no dia das eleições.
Este conteúdo foi originalmente publicado em PF deve manter indiciamento de Torres em caso que investiga bloqueio das rodovias nas eleições no site CNN Brasil.